Dentro
da perspectiva neoliberal, os sistemas de serviços públicos são articulados
para o fracasso. Se não há fracasso não há adesão ao setor privado. As pessoas,
se pudessem escolher não gastar com saúde e educação não o fariam. Para
articular tal falência de modo a não parecer realmente uma estratégia
articulada, constrói-se todo um discurso ideológico sustentado por um
equivocado ideal democrático. Tal ideal sustenta uma ideia de liberdade de ação
e estratégia pedagógica.
Cada
escola, cada professor cria suas próprias estratégias e ações para adaptar à
realidade de cada comunidade ou individuo. São os chamados Projetos Políticos
Pedagógicos. Isso é coerente com uma proposta humanista. O problema surge
quando todas as estratégias e ações elaboradas e executadas são avaliadas por
um sistema único, específico, elaborado por quem não elaborou e executou as
estratégias e adaptações pedagógicas. Ou seja, os vestibulares, o ENEM, SAEB,
SARESP, e qualquer avaliação ou processo seletivo não são elaborados por quem
executa o processo de ensino-aprendizagem. Portanto não há harmonia entre os
processos de construção e avaliação do conhecimento. Contudo, os índices
oficiais de desempenho educacional são comprometidos por uma simples questão de
incoerência entre as dimensões que compõem o sistema educacional.
Nesse
contexto o sistema educacional da redes privadas também tem a liberdade de
adaptarem as diretrizes básicas (LDB) ao contexto da comunidade, ou clientela,
e à realidade dos indivíduos (classe média e alta). Enquanto o sistema público
direciona as ações e estratégias à uma suposta construção da cidadania através
da valorização da diversidade, adaptando o conhecimento à realidade dos
discentes, o sistema privado direciona as ações para os processo seletivos. As
redes privadas têm mais coerência e harmonia em suas propostas do que a rede
pública em geral. Há muito mais homogeneidade do que a rede púbica no que diz
respeito ao preparo dos discentes ao acesso às universidades e aos concursos públicos.
Os
sistemas de ensino privado das grandes cidades do Brasil compartilham dos
mesmos profissionais e da mesma diretriz pedagógica oficial pública. Ou seja, a
LDB é o parâmetro único. A maioria dos professores das redes privadas também
são profissionais das redes públicas. Então onde está o problema? No sistema.
Busca-se,
como políticas públicas para a educação, uma articulação eficiente entre o
processo e a medição do processo objetivamente para a elaboração dos resultados
para índices públicos nacionais e regionais, assim como para os processos
seletivos em vestibulares e concursos.
Essa
dicotomia do sistema educacional em público e privado é também uma manutenção
das estruturas de desigualdade. No sistema capitalista neoliberal, enquanto
estrutura de sustentação da sociedade de consumo e competição para conquista de
poder (de consumo) , o caminho para tal conquista é a preparação para processos
seletivos. A construção da cidadania não necessariamente prepara para tal
competição. Mesmo quando não há muito rigor na seleção para a universidade,
tais como as instituições privadas de menor porte, as bases para uma boa
graduação não são bem construídas no ensino público, portanto as desistências e
má formação selecionam e excluem esse indivíduos
provenientes do sistema público no mercado de trabalho.
No
senso comum que constitui as relações entre sociedade e educação no Brasil, há
a maior valorização e crença no sistema privado. Mesmo que no sistema público
haja bons professores, bons recursos tecnológicos, boas propostas, boas
estratégias, e boas ações, a sociedade não acredita. Os pais não acreditam, os
próprios professores não acreditam, pois a maioria tem seus filhos em escolas
privadas. Há aqueles que tentam, que se arriscam com inovações e rupturas com
tradicionalismo e conservadorismos. Por vezes conseguem bons resultados, mas no
processo de avaliação e seleção convencional não há adaptações e rupturas que
atendam as individualidades e regionalidades aplicadas pelas iniciativas
inovadoras. No fim, temos um sistema de ensino público que forma mão de obra
barata e um sistema privado que prepara para os processos seletivos das
especializações de mais alto nível, portanto uma eficiente manutenção das
desigualdades e da exclusão arquitetado por diretrizes do mundo globalizado.
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