As diretrizes pedagógicas vêm
passando por um processo de adaptação à lógica Neoliberal. Nesse processo de
adaptação existem duas determinantes. A oferta do serviço “educação”
compartilhada com o setor privado e a empreitada de diminuir o índice de analfabetismo
e exclusão. Em um esboço rápido, o cenário educacional do Brasil, nos últimos
10 anos, passou um processo de expansão do acesso e queda na qualidade. Mais
vagas às populações de baixa renda e menores índices de rendimento escolar. Há
inúmeros fatores que explicam e justificam tal realidade.
O fato é que, nessa perspectiva
neoliberal e humanista (se é que seja possível caminharem juntas), todo
indivíduo tem o direito de passar pela escola. E é dever da escola, da família
e do Estado, promover a emancipação e o desenvolvimento do indivíduo. Esse
fator é um dos pontos fundamentais da progressão continuada. Tal estratégia foi
implantada contando com ações específicas para dar certo. E uma dessas ações é
a participação ativa da família da vida escolar do aluno (a). Ou seja, quando
um discente não estivesse com o rendimento adequado, seria responsabilidade da
família atuar junto à escola para a “recuperação” do mesmo, não sendo
necessária a reprovação. Normalmente isso não ocorre. A escola não consegue
promover tal participação. Portanto o aluno não é recuperado e vai sendo
aprovado continuamente sem desenvolver o mínimo necessário à sua idade escolar.
Perante tal realidade a procura
pelas instituições de ensino privado cresceu muito. Para fugir dessa realidade
de aprovação automática, sem garantir o desenvolvimento, as famílias que
tiveram condições econômicas mínimas para matricular seus filhos em tais
instituições o fizeram. Tivemos então um considerável aumento do número alunos
nas instituições privadas. Porém os pais que colocam os filhos em uma dessas
instituições não buscam a reprovação dos mesmos, mas sim o desenvolvimento sem
que ele (pai) necessite atuar diretamente no processo, no caso de seu filho, ou
filha, não se desenvolver por si só. Se a instituição é privada, subentende-se
que ela tem as ferramentas, recursos e métodos necessários para garantir o
pleno desenvolvimento de seu cliente.
Analisando o mesmo problema em
outra perspectiva, todo professor atuante no ensino básico, público ou privado,
deveria saber que os baixos índices de reprovação é o objetivo de qualquer
governo em desenvolvimento perante as relações neoliberais. Quanto menores tais
índices mais incentivo econômico e prestígio politico o país tem perante a
sociedade internacional. Assim sendo, as instituições privadas de ensino não
escapam de tal exigência. E é justamente por esse fator que um recurso de um
responsável, perante uma diretoria de ensino, contra uma reprovação, quase
sempre ganha. Ou seja, quando uma instituição privada apresenta a reprovação de
um discente e a família recorre à tal decisão perante os órgãos responsáveis (Diretorias
Regionais), na maioria dos casos a família ganha o recurso. Isso significa que
mesmo sendo uma instituição privada ela não tem autonomia para avaliar e
reprovar seus discentes como bem entender. Existe uma diretriz nacional que
deve ser respeitada. E a força da lei favorece tal diretriz, independente da
qualidade ou desenvolvimento do discente. O que está em jogo são números. Os
governos neoliberais prezam pelos índices favoráveis às suas propostas.
Essa questão é uma constante na
realidade escolar do país. Os "números pedagógicos" apresentados ao
final de cada ano letivo são resultados do longo e complexo processo de
avaliação promovido pelos professores dentro de cada instituição ou Unidade
Escolar. Nessa instância encontramos uma série de problemas. Não há harmonia
nos métodos, critérios e ferramentas de avaliação. Cada professor, em cada
disciplina, em cada instituição acaba efetuando de maneiras diferentes e
insuficientes. Insuficientes principalmente em relação à subjetividade e
variáveis que envolvem qualquer processo avaliativo. Muitos dos métodos de
avaliação ainda são convencionais. Provas, seminários, trabalhos de pesquisa,
resumos, resenhas, sínteses. Avaliam-se tais ferramentas com critérios de média
aritmética, desconsiderando-se o fato de que cada indivíduo tem facilidade, ou
não, com determinada ferramenta. Ainda existe o fato de que muitas dessas
ferramentas dependem diretamente de um nível mínimo de comprometimento do aluno
e da família com a vida escolar. E sabemos que isso é cada vez mais ausente.
Outro fator que precisamos reconhecer é que esses métodos não são suficientes
para realmente avaliar alguém. Os níveis de aprendizagem, de habilidades e
competências, de cognição de um individuo, dependem de uma série de fatores, e
se expressam de muitas maneiras diferentes. Desse modo nem sempre um discente
com o nível elevado de habilidades e competências terá boas notas, ou outro com
baixo nível de habilidades e competências terá más notas.
Aquele que apontar uma solução
para tal problema merece um Prêmio Nobel. Mas apontar possíveis ações que
amenizem a problemática é algo ao nosso alcance.
As instituições privadas precisam
inovar não somente as práticas, mas também os princípios. E tais princípios
devem estar sintonizados às diretrizes nacionais, sendo consciente, inclusive
das particularidades do contexto de uma instituição privada perante os órgãos
responsáveis. Quando estamos inseridos em um sistema precisamos compreendê-lo e
nos sintonizar a ele. Mesmo que seja para propor um novo. A diretriz nacional é
Neoliberal. Busca atender uma ampla rede de interesses econômicos e políticos.
Obedecem aos critérios e padrões do mundo globalizado. E, temos em nossas
"mãos" as ferramentas para humanizar tais diretrizes. Usar delas para
um fim social. Os órgãos competentes implantam as diretrizes no âmbito da
teoria. E nós, gestores e professores, o aplicamos na prática. Portanto nossa
responsabilidade é ainda maior. No caso específico de uma instituição privada,
existe a limitação e determinação das leis do mercado. Da qualidade enquanto
fator de oferta e procura. E obviamente está ao alcance de tais instituições promoverem
um tipo de ação socialmente sustentável. Que atenda às demandas do sistema
Neoliberal globalizado e ao mesmo tempo promova, mesmo que de maneira lenta e
gradual, um processo de emancipação cidadã. E dentro do paradigma
"reprovação", que representa um limite de transição entre as velhas e
novas concepções pedagógico-educacionais, é necessário que se repense e se
reelabore diretrizes que adaptem tal problemática ao contexto das instituições
privadas.
Devemos criar um consenso de que
uma instituição não deve, necessariamente, criar recursos que fundamentem as
reprovações, mas sim que os diminuam. Essas mesmas instituições tem, dentro de
suas possibilidades, um acesso maior às famílias, e por isso a ferramenta ideal
para adequar as práticas às novas realidades e necessidades. Em um exemplo
prático, quando um aluno estiver em situação de reprovação, independente do
motivo, a escola deve tomar a decisão sobre a reprovação, ou não, junto à
família. E se o poder público, nos referindo aos órgãos responsáveis,
considerar que tal aluno tem condições de ser promovido, do mesmo modo a
família, devidamente conscientizada da situação pela escola, também o
considerar, por que a instituição deveria então ter uma autoridade maior sobre
a questão?
Uma das maneiras de promover
autonomia e emancipação aos cidadãos é transferindo a eles, mesmo que gradativa
e conscientemente, a responsabilidade pelos seus atos. A escola é, antes de
qualquer coisa, o espaço e o tempo de emancipação do individuo. E quanto mais
esse princípio permear as ações pedagógicas/educativas mais harmônicas serão
suas relações e melhores serão seus resultados.
Comentários
Postar um comentário